Em diversos estados e municípios do país, professores do Ensino Básico público e particular têm se mobilizado contra a volta às aulas presenciais nas escolas, suspensas devido às medidas de isolamento frente à Covid-19. O Brasil entra no quinto mês da pandemia com mais de 2,8 milhões de casos e quase 100 mil mortos. Em muitos lugares, a curva de infectados não para de crescer.

No Rio de Janeiro, os professores da rede pública municipal de ensino decretaram greve contra o retorno previsto para segunda-feira (3). O mesmo aconteceu na rede estadual, com greve decretada para esta quarta-feira (5). De acordo com o Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação do estado (Sepe-RJ), a greve se fez necessária em decorrência da pandemia, que não está controlada, e resguardará “a vida de professores, funcionários de escolas, bem como estudantes e todos os seus familiares”, diz o sindicato. As atividades on-line com os estudantes serão mantidas, segundo o Sepe RJ, que defende que elas “precisam ser complementares” e não obrigatórias.

Já na rede particular, os professores organizados pelo Sindicato dos Professores do Município do Rio de Janeiro e Região (Sinpro-RJ) decidiram, em assembleia realizada no dia 1° de agosto, manter a greve decretada em 6 de julho contra a volta às aulas presenciais prevista para ocorrer na segunda (3). O retorno, segundo a entidade, só deverá ocorrer com a garantia das autoridades da saúde e da ciência, com base em rígidos protocolos de segurança.

O Ministério Público e a Defensoria Pública tentam suspender o retorno das aulas em escolas particulares da capital. Porém, no domingo (2), o pedido foi negado pela Justiça. MP e DP tentam recorrer da decisão do plantão judiciário. As instituições consideram que o retorno às aulas presenciais “traz risco à vida e saúde da coletividade, além de promover desigualdade de acesso à escola” e basearam seus pedidos num estudo da Fundação Oswaldo Cruz Fiocruz (Fiocruz) que prevê 3 mil novas mortes no Rio de Janeiro com um possível retorno das aulas em agosto.

Fora o Rio de Janeiro, as escolas particulares do Amazonas e do Maranhão retomaram as aulas, de acordo com os dados da Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep). Outros nove estados e o Distrito Federal têm propostas de data para retornar às atividades presenciais. São eles: Acre, Pará, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Alagoas, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul.

Amazonas

Em Manaus (AM), os professores da rede pública aprovaram indicativo de greve para esta quarta-feira (5) contra a determinação do governador Wilson Lima (PSC) para o retorno dos professores às escolas na segunda (3), dos alunos do Ensino Médio no próximo dia 10 e dos estudantes do Ensino Fundamental no dia 24. Ainda não há previsão para retorno das aulas no interior do estado. “É um decreto genocida e transforma as escolas em verdadeiros abatedouros”, diz, em nota, o Sindicato dos Professores e Pedagogos de Manaus (Asprom Sindical).

Segundo o sindicato, a pandemia da Covid-19 ainda não está controlada na capital amazonense e o plano de retorno apresentado pelo governo não previu as reformas das janelas das salas de aulas e dos professores, testagem em massa dos trabalhadores da Educação e dos alunos para a detecção dos possíveis contaminados assintomáticos e, ainda, não previu nenhum controle do poder público sobre o transporte coletivo urbano, que é o principal meio de transporte utilizado por professores e alunos para se locomoverem. Caso o governo do Estado não volte atrás na decisão, a categoria se reunirá em nova assembleia e deflagrará greve contra o retorno das aulas presenciais. Uma carreata foi realizada para chamar a atenção da população e cobrar dos parlamentares da Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam) uma audiência pública sobre os riscos do retorno precipitado das aulas presenciais. As escolas particulares de Manaus retomaram as atividades presenciais no início de julho.


Distrito Federal

No Distrito Federal, os alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA) e de educação profissional retomam as atividades presenciais no dia 31 de agosto. O retorno presencial será pelo sistema híbrido, no qual metade da turma irá à escola em uma semana e os demais terão aulas remotas em plataforma online. Na semana seguinte, as turmas se invertem. No dia 8 de setembro, será a vez do Ensino Médio e em 14 de setembro retornam os estudantes dos anos finais do Ensino Fundamental. Em 21 de setembro, voltam os anos iniciais do Fundamental. Para a Educação Infantil, a retomada está marcada para 28 de setembro, enquanto para os centros de ensino especial, Educação Precoce e classes especiais, as atividades presenciais retornam em 5 de outubro.

O Distrito Federal assumiu a liderança no ranking dos estados com pior desempenho no combate à pandemia do novo coronavírus no país, conforme lista elaborada pelo Centro de Liderança Pública (CLP), publicada no dia 30 de julho. Os critérios adotados são proporção de casos confirmados, evolução logarítmica de casos e porcentual de mortalidade da Covid-19, entre outros. Logo depois, aparece o Rio de Janeiro.

O Sindicato dos Professores no Distrito Federal (Sinpro-DF) apresentou uma carta aberta dos diretores de escolas públicas do DF ao governador Ibaneis Rocha (MDB), afirmando ser inaceitável a reabertura das escolas, especialmente, “num momento tão grave, onde se constata o avanço da pandemia do novo coronavírus, com o aumento drástico do contágio e do número de mortes”. O retorno colocaria em risco a vida de professores, funcionários e alunos, de “forma desnecessária”. Entre diversas ações, o sindicato também lançou uma campanha: “Diga não ao retorno presencial nas escolas”.

Já em relação à reabertura das escolas particulares, após um impasse, a Justiça do Trabalho autorizou o retorno das aulas presenciais nas escolas da rede privada do DF. Em julho, o Ministério Público do Trabalho (MPT) entrou com uma ação contra o decreto do governo que autorizou o retorno das escolas particulares no dia 27 de julho. Em audiência de conciliação realizada na última segunda-feira (3), a juíza apresentou uma proposta de cronograma para retorno da rede privada a partir do dia 10, mas não houve anuência do governo do DF e do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do DF (Sinepe-DF), que defendem a autonomia das escolas para estabelecerem seus calendários.

Em comunicado, o Sindicato dos Professores em Estabelecimentos Particulares de Ensino do Distrito Federal (Sinproep-DF) informou que lamenta a decisão e que está em contato com o MPT para entrarem com recurso no Tribunal Regional do Trabalho, para a suspensão das aulas. “O sindicato mantém o seu posicionamento de que este não é o momento propício para o retorno das aulas presenciais, o que, por certo, colocará em risco a saúde e a vida dos trabalhadores da educação, dos alunos e da comunidade escolar”, manifestou a entidade.
 

São Paulo

Em São Paulo, o governo do estado anunciou um plano para a retomada das aulas presenciais a partir do dia 8 de setembro em toda a rede de ensino. A medida valeria tanto para a rede pública quanto a privada, da educação infantil até o ensino superior. Entretanto, vários municípios – a maioria prefeituras do ABC Paulista e de Mauá – decidiram que a volta às aulas presenciais na rede municipal só deveria acontecer em 2021. Na cidade de São Paulo, após muita pressão, a Secretaria Municipal de Educação voltou atrás e não deu certeza sobre o retorno às aulas no dia 8 de setembro. Dias antes, professores de várias regiões do estado realizaram uma carreata em defesa da vida, com mais de 250 carros. Para o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) o retorno às aulas provocará uma nova onda de contágio da Covid-19, o que poderá levar a um novo pico da pandemia.

Maranhão

Instituições de ensino da rede privada retornaram às aulas presenciais na segunda-feira (3), no Maranhão. Em São Luís, com poucas exceções, a maioria das escolas optou por começar a volta pelos alunos do terceiro ano do ensino médio. Nos outros níveis de ensino, o retorno deve ser realizado na próxima semana.

O Sindicato dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino da Rede Particular do Estado do Maranhão (Sinterp/MA) se manifestou de forma contrária ao reinício das aulas presenciais “em face da insegurança manifestada por pais de alunos, trabalhadores administrativos e professores das instituições de ensino privado, quanto ao risco de contaminação pelo coronavírus”. Para a entidade, é contraditória, em termos de política de saúde, a obrigatoriedade do retorno dos trabalhadores da rede particular de ensino em momento distinto daquele dos trabalhadores da rede pública.

Já a rede de ensino pública segue sem data prevista para o retorno presencial nas escolas, após a volta ter sido adiada mais uma vez pelo governador Flávio Dino (PcdoB). Após uma reunião com o Sindicato dos Trabalhadores em Educação Básica das Redes Públicas Estadual e Municipais do Estado do Maranhão (Sinproesemma), o governo divulgou, no dia 28 de julho, comunicado adiando o retorno das aulas, programado para o dia 10 de agosto para o terceiro ano do ensino médio, bem como para os demais níveis de ensino na rede pública estadual. O governo estadual, em nota, afirmou que manterá as aulas não presenciais e dará mais tempo para que as comunidades escolares debatam. “Vamos continuar o processo de consulta aos estudantes e às suas famílias, assim como as reuniões com o Sinproesemma”.

Paraná

No Paraná, a Secretaria de Educação e Esporte do Estado (Seed) publicou no dia 31 de julho as regras para o retorno das atividades escolares presenciais previstas para setembro. Porém, no domingo (2), a Seed voltou atrás e publicou que a previsão de retorno ainda será confirmada pela Secretaria de Saúde (Sesa) nos próximos 14 dias. Antes, professores denunciaram que a Seed teria apresentado um termo para responsáveis e estudantes assinarem os responsabilizando caso se contaminem pelo novo coronavírus durante as aulas. Após diversas críticas, o termo foi modificado.

De acordo com dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná (APP-Sindicato), o governo tem ciência que a retomada presencial das aulas causará aumento dos casos de contaminação e mortes e quer passar essa responsabilidade para a comunidade. O Sindicato vê com preocupação a ausência de posicionamento técnico da Secretaria da Saúde (Sesa), até o momento, e o indicativo de que o governo planeja o retorno das aulas ainda durante a pandemia do novo coronavírus.

No Paraná, 56% dos casos do novo coronavírus em crianças com menos de 12 anos foram confirmados em julho, de acordo com a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa). Dados do dia 3 de agosto mostram que o estado acumula, desde março, cerca de 80 mil diagnósticos positivos e 2.028 mortes.

Rio Grande do Norte

Após muita pressão da comunidade escolar e do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Rio Grande do Norte (Sinte-RN), que cogitou uma greve, o prefeito de Natal, Álvaro Dias (PSDB), recuou e divulgou na semana passada (29) um comunicado suspendendo o retorno às aulas presenciais previstas para 10 de agosto, no caso das escolas particulares, e 14 de setembro, para os estudantes da rede municipal. A governadora, Fátima Bezerra (PT), indicou que o decreto, que trata do funcionamento das instituições de ensino, deverá ser renovado, afirmando ser “mais prudente prorrogar a suspensão das aulas”. Para o sindicato, as aulas presenciais não devem voltar este ano. Além dos riscos para a saúde ao retornar às aulas presenciais, os educadores de Natal têm um elemento que reforça a possibilidade de greve que é o não pagamento do piso salarial de 2020.

Estudo Fiocruz

Um documento publicado pela Fiocruz, sobre retorno às atividades escolares no Brasil durante a pandemia de Covid-19, afirma que o primeiro critério para a reabertura das escolas é o controle da transmissão da doença. A reabertura deveria ser “realizada à luz da ciência e orientada por diretrizes gerais de órgãos como a OMS, visto que recolhe informações diárias dos países que enfrentam problemas semelhantes na pandemia”.

Na ausência de vacinas ou tratamentos específicos, defende a fundação, a política do distanciamento social tem sido a mais amplamente utilizada por outros países para o controle da pandemia, associada à medidas de vigilância e ampla testagem com identificação precoce de casos e contatos.

A Fiocruz aponta também que a abertura diferenciada entre o setor público e o privado acentua a desigualdade de acesso ao ensino e, realizada sem as melhores condições epidemiológicas, coloca em risco parcela de alunos e professores da rede escolar dos estados e municípios.

Via: ANDES-SN.