A Câmara dos Deputados aprovou, na noite de terça-feira (3), o Projeto de Lei (PL) 2633/20. A proposta é chamada de “PL da Grilagem” por regularizar a ocupação indevida de terras públicas, favorecer a impunidade de crimes ambientais e facilitar o desmatamento ambiental. Agora, matéria será enviada para votação no Senado.

O PL, aprovado com 296 votos favoráveis a 136 contrários, atende aos interesses da bancada ruralista, um dos braços de apoio do governo de Jair Bolsonaro no Congresso Nacional. O presidente já havia editado uma medida provisória (MP 910) sobre o mesmo tema em dezembro de 2019. Mas a matéria não foi validada em 120 dias e perdeu vigência. O projeto enfrenta ampla rejeição de ambientalistas, movimentos populares, sociais e sindicais e das deputadas e dos deputados de oposição, que tentaram obstruir a votação, mas foram vencidos pela maioria.

Novas regras
A proposta passa de 4 para 6 módulos fiscais o tamanho da propriedade ocupada, a qual poderá ser regularizada sem vistoria presencial feita pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Módulo fiscal é uma unidade de medida agrária expressa em hectares, variável de 5 a 110 hectares, sendo fixada pelo Incra para cada município, e que varia em cada região do país.

O texto estabelece novas regras para a Lei 11.952/09, que valerão para imóveis da União e do Incra em todo o país em vez de apenas os localizados na Amazônia Legal, como ocorre hoje. A data de referência da ocupação continua a ser 22 de julho de 2008, atualmente prevista na lei. A data de 2008 coincide com a anistia ambiental concedida pelo Código Florestal de 2012.

O texto aprovado é o substitutivo do relator, deputado Bosco Saraiva (Solidariedade-AM), que abre brechas para beneficiar inclusive posseiros multados por infração ao meio ambiente, se for atendida qualquer uma destas condições: imóvel registrado no Cadastro Ambiental Rural (CAR), adesão ao Programa de Regularização Ambiental (PRA) ou o interessado assinar termo de compromisso ou de ajustamento de conduta para recuperar vegetação extraída de reserva legal ou de Área de Preservação Permanente (APP).

Em nota, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) rechaçou o PL 2633 e reforçou a importância do governo priorizar a regularização fundiária por meio da atual legislação (Lei nº 11.952/09), que é a única forma de garantir segurança jurídica e fazer justiça social aos agricultores e agricultoras. “Esse projeto representa um grande retrocesso e vem sendo denunciado pela Contag há tempos, pois não tem o objetivo de beneficiar a agricultura familiar, como vem propagando a base aliada do governo federal. Na verdade, alertamos que pode trazer graves prejuízos a este público, tais como o aumento dos conflitos agrários, sobreposição de área dos agricultores e agricultoras e a possível regularização da grilagem e do desmatamento nas terras da União”, afirmou a entidade.

A Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas (FPMDDPI) alerta para o momento crítico em que o PL da Grilagem foi aprovado pela Câmara dos Deputados, quando o desmatamento no Brasil bate recorde. “O PL da Grilagem beneficia a grilagem de terras públicas, além de trazer prejuízos para as regiões florestais, como por exemplo, a Amazônia, Cerrado e biomas onde o agronegócio avança cada dia mais”, criticou.

Em julho, quando foi aprovado o regime urgência de votação do projeto, Kelli Mafort, da Coordenação Nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), afirmou que o projeto de regularização fundiária era, na verdade, a regularização do crime de grilagem. “Pelo menos, 65 milhões de hectares de terras públicas podem ser retirados do povo brasileiro e da União e repassados a grandes proprietários de terras, empresas do agronegócio e da mineração. Esses proprietários de terra não estão enquadrados em nenhuma regra socioeconômica para que possam ter acesso a este benefício. Eles não são aptos a nenhum programa social de Reforma Agrária”, declarou.

Senado
No Senado também tramita o PL 510/21, de autoria do senador Irajá Abreu (PSD-TO), com o mesmo teor do PL 2633, que facilita que terras públicas desmatadas de modo ilegal se tornem propriedades de quem as utiliza. O projeto tem como proposta a alteração de leis que versam sobre a regularização fundiária no Brasil, flexibilizando e favorecendo a expansão dos latifúndios em terras públicas, possivelmente adquiridos a partir da grilagem.

* Com informações de Agência Câmara de Notícias e FPMDDPI. Foto: Alex Ribeiro/Agência Pará
Via: ANDES-SN.