O presidente da Câmara Arthur Lira pretende colocar em votação esta semana o projeto de lei 948/2021 que libera a compra de vacinas contra a Covid-19 por empresários. O texto burla o Plano Nacional de Imunização pelo SUS, criando um camarote vip, de fura-filas, num momento em que a campanha de vacinação no país para toda a população segue a passos lentos.
A proposta, de autoria do deputado Hildo Rocha (MDB-MA), é um escândalo e expressa o famoso ditado popular “Farinha pouca, meu pirão primeiro”.
O texto altera a lei 14.125, publicada no início de março, que já tinha autorizado a compra de vacinas pela iniciativa privada, desde que 100% das doses adquiridas sejam doadas ao SUS, até que todos os setores prioritários sejam imunizados. Após ser garantida a imunização deste segmento, as empresas poderiam ficar com 50% e seguir doando outros 50% ao PNI. Mas, agora, de olho em lucros, a iniciativa privada quer 100% das doses para utilização exclusiva e própria.
O discurso do empresariado, que tem apoio do governo Bolsonaro e dos presidentes da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco, é de que o projeto permitiria que as empresas vacinassem seus empregados e familiares e mantivessem “os negócios em pé”. Um falso altruísmo que esconde puro egoísmo e ganância por lucros.
Ineficácia no combate à pandemia
A proposta vem sendo fortemente criticada por especialistas da área da saúde e órgão públicos, como o Ministério Público, pois além de imoral, a medida afetaria o plano nacional de imunização do país e dificultaria ainda mais a vacinação gratuita da população pelo SUS.
A alegação de que a aquisição de vacinas pelo setor privado suspostamente aceleraria a imunização no país não é verdadeira.
Afinal, a falta de imunizantes no Brasil é culpa do governo de Bolsonaro que desdenhou das vacinas no ano passado e não contratou com antecedência as doses suficientes para a população brasileira. Agora, a disputa por vacinas em todo o mundo está muito mais acirrada e, oficialmente, os laboratórios afirmam que suas produções serão destinadas aos governos em todo o mundo nos próximos meses. Portanto, numa eventual possibilidade de aquisição por setores privados isso implicaria em tirar do setor público, podendo até causar inflacionar o mercado.
Ainda segundo os especialistas, furar a fila da vacina não combate efetivamente a pandemia e é injusto com os grupos prioritários que precisam ser vacinados antes. Os cientistas destacam que as vacinas protegem contra as formas graves e mortes pela Covid, mas as pessoas ainda poderão se contaminar, ficar assintomáticas ou levemente doentes, transmitindo o vírus.
O pesquisador da Fiocruz Jesem Orellana, criticou a medida, em entrevista ao site Rede Brasil Atual. “Quando penso no país como um todo, não posso alegar que, protegendo parte do comércio, uma pequena fração da população, estarei fazendo minha parte e contribuindo para o controle da epidemia. Não, pois estarei fazendo o vírus circular dentro do meu estabelecimento ou fora dele, já que quem se dirige a ele e sai dele não estará vacinado, em geral. Penso até mesmo em riscos para o estoque do SUS, com a possibilidade de compra por fora do PNI”, alertou.
Vacinação gratuita pelo SUS e para todos(as) já!
Para o integrante da Secretaria Executiva Nacional da CSP-Conlutas Atnágoras Lopes, a oficialização do esquema de fura-filas é vergonhosa e inaceitável.
“Depois do escândalo da vacinação clandestina e ilegal patrocinada por empresários do setor de transporte em Belo Horizonte, é absurdo que a Câmara e o governo Bolsonaro tentem oficializar o esquema de fura-filas”, afirmou.
Em Belo Horizonte, empresários do transporte realizaram uma vacinação ilegal na garagem de uma empresa de ônibus. Segundo investigações, cerca de 50 empresários e políticos foram vacinados, pagando cerca de R$ 600 cada um. O caso foi denunciado por uma reportagem da revista Piauí e virou caso de investigação pela Polícia Federal, que já descobriu que o esquema foi feito por uma golpista e que as seringas não tinham imunizantes contra a Covid-19, mas apenas soro.
Em BH, cerca de 50 empresários e políticos patrocinaram vacinação clandestina, que virou caso de polícia
“Bolsonaro, em vez de seguir com sua política negacionista que está causando um genocídio no país, precisa garantir vacinação em massa para toda a população, de forma gratuita pelo SUS, urgentemente”, disse. “Para isso, além de correr atrás do prejuízo e negociar a compra de mais doses o mais rápido possível, o governo tem de quebrar as patentes das vacinas contra a Covid-19, investir em Ciência e Tecnologia e determinar a reconversão de setores da indústria, para que o país possa produzir imunizantes em solo nacional. Só assim teremos vacinas para toda a população”, afirmou o dirigente.
A CSP-Conlutas defende que além da vacinação, o grave momento da pandemia também exige um lockdown nacional de 30 dias com auxílio emergencial digno e apoio aos pequenos proprietários, pois só assim poderemos deter a disseminação do vírus, a escalada de mortes e o colapso nos hospitais.
Via: CSP-Conlutas.